"A marcha da maconha é legal"
O ministro do STF antecipa seu voto ao dizer que o cidadão tem o direito de defender sua posição em passeata
Quem visita o gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello está acostumado a ouvir música clássica. O som de Franz Liszt é sua inspiração ao redigir os pareceres em processos sempre empilhados aos montes sobre as mesas, para tentar dar conta de um trabalho invencível. Aos 63 anos, sem esmorecer diante da infindável demanda jurídica, o ministro completa quatro décadas de dedicação ao que para muitos seria enfadonho ou repetitivo, mas, para ele, é paixão. Por isso é reverenciado no mundo jurídico. Ele não delega a redação de seus votos a ninguém e muitas vezes trabalha até as cinco horas da manhã. Homem de hábitos simples, um de seus maiores prazeres é comer hambúrguer no McDonald's. Ao receber ISTOÉ, fez questão de demonstrar a revolta com o que está acontecendo no Senado. "Os atos secretos me preocupam não apenas como juiz, mas como cidadão desta República." Explicou que raramente aplica o sigilo aos processos dos quais é relator. Ao contrário, muitas vezes antecipa suas decisões. Revelou que votará a favor dos organizadores de passeatas pela descriminalização da maconha, acusados de apologia da droga. "Se o cidadão não pode expor seu argumento a favor do uso da maconha, ele está tendo o direito de opinião cerceado." ISTOÉ - O que mais impressionou o sr. nesses 20 anos de Supremo Tribunal Federal? Celso deMello - A promulgação da Constituição em 1988 restabeleceu a confiança e a fé na excelência do regime democrático. Restabeleceram- se as liberdades públicas, suprimiram- se as restrições que até então haviam sido autoritariamente impostas e transformou-se o Judiciário num sujeito concretizador dos anseios que a Constituinte exprimiu. Deu-se ao Judiciário, e em particular ao STF, um poder excepcional. Veja o exemplo do mandado de injunção: foi o meio de que se valeu o STF para suprir omissões do Parlamento tão lesivas quanto as próprias ações do Poder Público que transgridem diretamente a ordem constitucional. Houve um instante em que se criticou o denominado ativismo judicial do Supremo. ISTOÉ - Há quem diga que a Constituição foi longe demais, pois havia grande peso de ideias progressistas. Seria necessária, então, uma revisão constitucional. ISTOÉ - O ideal seria uma Constituição sucinta como a americana?
ISTOÉ - O sr. se refere a casos em que o Estado não cobre um tratamento? ISTOÉ - Outro caso que provocou muita polêmica nesses últimos anos do STF foi a taxação dos inativos. ISTOÉ - O sr. acha a taxação dos inativos injusta? ISTOÉ - O inativo também não recebe reajuste igual ao das categorias de funcionários ativos.Mello - Embora devesse, porque a Constituição construiu um modelo de seguridade social que envolve três domínios distintos: o da saúde, o da assistência e o da previdência social. Em relação à saúde e à assistência, não há contribuição. Num acidente, a pessoa é levada ao hospital público e não precisa remunerar o hospital. A saúde não exige contribuição, a assistência não exige, mas a previdência exige. ISTOÉ - Em que outros casos o sr. acha que o STF se equivocou? ISTOÉ - Nesses 20 anos de STF, qual foi o caso mais folclórico? | ||||